18/12/2017
ENTREVISTA: Shadowside (Brasil)
A Entrevista desta semana é com a banda paulista Shadowside, que atualmente é formada por Dani Nolden (Vocal), Raphael Mattos (Guitarra), Magnus Rosén (Baixo) e Fabio Buitvidas (Bateria). Realizamos uma entrevista exclusiva com a vocalista Dani Nolden, onde ela nos fala um pouco do inicio da carreira da banda do novo álbum "Shades of Humanity", lançado este ano é muito mais, confiram a seguir:
EC - Primeiramente gostaria de lhe agradecer Dani por ter aceitado
realizar a entrevista. Como é a nossa primeira entrevista, você poderia falar
um pouco como surgiu a ideia de formar o Shadowside?
Dani: Eu que
agradeço pelo espaço! A banda basicamente veio da paixão pela música, nada além
disso... o Shadowside nasceu meio que no estúdio, com a intenção de registrar
de forma permanente as músicas que tínhamos na época. Gravamos um demo EP,
enviamos para algumas revistas, e a reação foi tão forte e surpreendente que
acabamos decidindo levar a banda mais a sério, dar uma chance àquela ideia para
ver até onde ela nos levaria... e aquela diversão de adolescentes que curtiam
heavy metal acabou virando uma banda que superou todos os meus sonhos e tocou
em 30 países ao redor do mundo. Tudo ainda parece meio surreal. Parece que
estou contando a história de outra banda (risos). Mas é a banda que comecei a
planejar aos 14 anos de idade.
EC - Nós anos de 2011, 2012 e 2013, você ganhou na votação do Whiplash, a
melhor vocalista feminina nacional, o que é bem significativo já que é o
público que escolhe os vencedores. Como você se sentiu em relação a isso?
Dani: Muito
honrada, especialmente porque tem muita mulher cantando demais em bandas
excelentes, então fiquei muito feliz e grata pelo apoio do público. Meu estilo
de cantar sempre foi bastante passional, sempre coloco tudo aquilo que sinto na
voz, o que torna tudo ainda mais pessoal pra mim. Eu não vejo a música como uma
competição, mas é claro que ser colocada em uma posição dessa pelo público é
algo muito especial e um reconhecimento enorme.
EC - A cada ano que passa mais mulheres estão ingressando no mundo do
metal, seja como parte das bandas ou na produção de shows, e o próprio
público feminino têm aumentado. Mas mesmo nesse cenário, existe muito
radicalismo e machismo. Você já sofreu algum tipo de preconceito no meio do
metal? E o que você diria para as mulheres que gostariam de fazer parte de uma
banda ou vivem a cena?
Saarbrücken Alemanha 2013 by Costabile Salzano |
Sinceramente, hoje não vejo esse machismo todo. Só
acredito que ele exista porque outras meninas relatam, mas eu nunca senti isso
na pele e acho de verdade que não exista mais alguém que se recuse a ouvir uma
banda só porque tem uma mulher cantando ou tocando na mesma. Se o cara for
machista, ele pode até não admitir que gosta, mas a música é algo tão poderoso
que ninguém resiste a algo que escuta e gosta, então ele pode até fingir que
não curte, mas vai ouvir escondido no quarto ou no fone de ouvido (risos).
Só posso dizer para as mulheres que vivem ou querem
viver a realidade de uma banda, ou do trabalho nos bastidores, o seguinte:
VENHAM! E venham sem medo! Venham com força, com confiança, mostrem o trabalho
de vocês, que no instante que vocês subirem no palco e fizerem um som de
qualidade, machismo algum vai resistir. Machismo não se combate com briga, se
combate com fato... e qualquer homem que por acaso ainda pense que mulher não
sabe fazer heavy metal vai ver que ele estava enganado quando ele ouvir algo
que ele curta. A grande maioria dos fãs do Shadowside é formada por homens, e
além de eles sempre terem nos dado muito apoio, eles sempre mantiveram o foco
na música. Temos um público feminino bem grande também, que sempre nos dá muita
força, mas como hoje temos acesso aos números de redes sociais, podemos ver que
mais de 70% dos fãs do Shadowside são homens, então não posso falar que nossos
fãs são machistas.
EC - Podemos dizer que o terceiro álbum do Shadowside, o “Inner Monster
Out” é um divisor de águas na carreira da banda, certo? Com o álbum vocês
conquistaram projeção mundial. Levando a Shadowside a vencer o 11º Independent
Music Awards por votação popular, um conceituado prêmio norte-americano, na
categoria Melhor Álbum de Metal/Hardcore. Você imaginava que o álbum fosse ser
tão marcante na carreira da banda?
Dani: Não,
nós não tínhamos ideia, especialmente porque foi nele que começamos a fazer as
músicas da maneira como fazemos hoje, de forma espontânea, procurando agradar a
todos os membros da banda, trabalhando todas as músicas como um grupo até que
todos fiquem orgulhosos do trabalho. O “Inner Monster Out” foi o álbum que
iniciou tudo isso, foi um álbum que fizemos para agradar primeiro a nós mesmos,
fizemos as músicas do jeito que nós gostamos de ouvir e de tocar, e felizmente,
o público gostou dele tanto quanto nós!
EC- Atualmente vocês são uma das bandas nacionais com mais repercussão
no exterior. Tendo realizado turnês em mais de 30 países diferentes. Como é
tocar em países que muitas vezes tem uma cultura bem diferente do Brasil? Você
já passou por alguma situação engraçada ou alguma experiência inusitada no
exterior que poderia compartilhar conosco?
Bochum Alemanha 2013 Foto: Costabile Salzano |
EC - Agora vamos falar um pouco do mais recente álbum do Shadowside, o “Shades of Humanity”, ele é o primeiro álbum com o Magnus Rosén (ex-Hammerfall) assumindo permanentemente o baixo na banda. Como ocorreu essa parceria, que resultou nele como um membro definitivo da banda? O que essa mudança na formação influenciou na criação do novo álbum?
Dani: Inicialmente, nossa ideia era apenas chamar
alguém pra gravar o álbum, porque não queríamos apressar a escolha do baixista
definitivo da banda. Basicamente, todos os problemas que tivemos de mudança de
formação no passado teriam sido evitados se tivéssemos sido um pouco mais
pacientes, porque as pessoas às vezes não são compatíveis, têm planos
diferentes, então pensamos em um baixista provisório para que depois pudéssemos
escolher o novo membro com calma. Como já tínhamos o plano de gravar na Suécia,
imediatamente lembramos do Magnus, porque sempre o admiramos demais como músico
e todos nós o consideramos um dos melhores baixistas de Heavy Metal do mundo.
Nós já havíamos sido apresentados no show que fizemos com o Helloween na
Suécia, então eu decidi entrar em contato e perguntar se ele topava gravar
conosco, e ele disse que sim. Então conversamos um pouco sobre a forma de
compor da banda, como trabalhamos sempre em equipe, sobre os planos, e logo
ficou evidente que o Magnus pensava de forma bem parecida que a gente, e tudo
estava fluindo tão bem e tão naturalmente que fizemos o convite “oficial” e
perguntamos se ele queria ser membro efetivo da banda... e ele, como você já
sabe (risos), aceitou! Ele gostou muito do fato de sermos brasileiros, porque
ele adora o Brasil, e uma das coisas que contou bastante para que ele aceitasse
entrar na banda foi por nós fazermos as músicas em equipe, gostamos que todo
mundo na banda tenha a oportunidade de compor, e ele adorou essa ideia. Ele
tinha algumas músicas que ele tinha feito com o Andy La Rocque, guitarrista do
King Diamond e nos ofereceu algumas que ele achava que tinham a cara da
Shadowside... e tinham mesmo! O Fabio e o Raphael mudaram alguns arranjos e
riffs, eu acrescentei a melodia e as letras, e no final das contas, tínhamos
duas músicas, “Unreality” e “Haunted”, que vieram do mais novo membro da banda!
SoH é o quarto álbum de estúdio do Shadowside |
Acredito que a maior influência da entrada dele na
banda foi o espírito de equipe dele e como ele já entrou “vestindo a camisa”.
Ele se encaixou perfeitamente conosco. Eu, o Raphael e o Fabio temos um jeito
de trabalhar muito peculiar, que nunca funcionou muito bem com outras pessoas,
principalmente pelo fato de sermos muito diretos e sinceros uns com os outros.
Nós três sentimos que não faz muito sentido ficarmos de rodeios quando temos
que falar que algo está ruim, porque entendemos que quando fazemos uma crítica
entre nós, não é pra magoar ou irritar, é pelo bem da banda, e porque sentimos
que pode melhorar... não faria sentido perder tempo criticando algo se sentíssemos
que não tem como sair algo mais interessante dali. E o Magnus pensa da mesma
forma... ele elogia quando tem que elogiar, e critica tudo aquilo que ele acha
que deve, e entende perfeitamente que nós gostamos muito das “diferenças
musicais” que muitas vezes acaba com bandas... nossa identidade vem justamente
dessas diferenças, porque nós somos obrigados a criar algo que quatro pessoas
com gostos totalmente diferentes curtem.
Então, o Magnus veio com uma experiência musical
enorme, influências totalmente diferentes, e chegou engajado, interessado,
disposto a levar a banda pra frente, então essa atitude dele influenciou muito
no clima das gravações, porque, pela primeira vez em toda a nossa carreira,
finalmente todos nós estávamos formando um grupo, uma equipe de verdade. Mesmo
depois de terminar de gravar o baixo, ele continuou indo ao estúdio, sempre
querendo ouvir o que tínhamos feito. Ver todo esse interesse e vontade de
trabalhar pela banda, vindo de um cara que tinha acabado de se juntar a nós, e que
já foi indicado ao Grammy e tem vários discos de ouro na carreira, deixou muito
claro pra nós como ele era o cara certo pra Shadowside.
EC – As temáticas trabalhadas no “Shades of Humanity” são muito amplas,
mas uma música em especial chamou muitíssimo a minha atenção, principalmente
pela excelente letra, e gostaria que você falasse um pouco dela, a “Stream of
Shame”, como foi escrever uma música para um momento tão difícil da história
recente do Brasil, o desastre de Mariana?
Dani: Aquele desastre me
chamou demais a atenção... normalmente eu sou bem “fria” com relação a notícias
e desastres, mas algumas coisas acabam mexendo bastante comigo, e o desastre de
Mariana foi uma dessas coisas. Todo o impacto ambiental, toda a destruição da
vida das pessoas, seja pelas mortes em si, seja pelas perdas materiais de uma
vida inteira, tudo causado pela ganância, o que é vergonhoso para todos nós
como brasileiros e como seres humanos, e por isso o nome da música é “Stream of
Shame”, que significa em uma tradução livre “rio da vergonha”, em português.
Agora se discute de quem é a culpa, muitas pessoas ainda não foram indenizadas,
e a realidade é que tudo isso foi causado por ganância, pela busca desenfreada
por lucros... é a sede interminável do ser humano pelo dinheiro e pelo poder
que o dinheiro traz, só que ‘dinheiro não se come’, e a vida humana e o meio
ambiente valem muito mais do que qualquer fortuna. É simplesmente vergonhoso
que a humanidade seja capaz de produzir esse tipo de destruição a troco de
nada.
EC – O “Shades of Humanity” também trata de outros assuntos que geram
bastante discussão na sociedade, como o aborto e a depressão. Você poderia
falar um pouco do conceito do álbum? Como surgiu a ideia de trabalhar esses
temas nas músicas?
Dani: Eu estava passando
por um período bem obscuro e introspectivo na minha vida, e como os meninos
deixam a tarefa de escrever as letras comigo, acabei escrevendo sobre tudo
aquilo que estava me fazendo refletir naquele momento. Percebi que todos nós,
seres humanos, somos capazes de atos extremos - ao mesmo tempo que podemos
destruir tudo ao nosso redor, também somos capazes de nobreza nas atitudes. A
natureza humana é caótica, e nenhum de nós é totalmente “do bem” ou “do mal”,
por melhor ou pior que alguém seja, tudo que é relacionado à moralidade humana
é feito de vários tons de cinza, então o nome do álbum brinca com os tons de
cinza e com a humanidade, trazendo “tons de humanidade”. O aborto e a depressão
estão bem inseridos nesses “tons de cinza”, porque muitas vezes julgamos o
assunto a partir de um ponto de vista simplório, de uma convicção pessoal, mas
não analisamos tudo aquilo que está em jogo, o que a pessoa está sentindo, o
que todos ao redor estão passando, nada é simples. A música que fala sobre o
aborto é “What If”, e traz a ideia do ponto de vista de um embrião, que está
sentindo que sua mãe está sofrendo e lutando contra a própria consciência,
decidindo se deve realizar um aborto ou não, e o embrião já a ama tanto que
quer se sacrificar e morrer para que ela não sofra mais. É claro que é só uma
história, mas é para ilustrar que sempre existem vários pontos de vista, além
de várias situações que parecem simples para quem não as vive. “What If” não é
um julgamento contra quem aborta, é apenas uma constatação de que existem dois
lados nessa situação, e que as pessoas são constantemente confrontadas com
questões éticas. Muitas vezes, somos obrigados a tomar decisões que vão contra
nossos valores, e a decisão de abortar ou não pode ser uma delas.
Foto de divulgação do clipe "Alive" |
Dani: Nós adoraríamos
fazer mais vídeos assim! Quem dirigiu o videoclipe de “Alive” foi o Daniel
Stilling, que já trabalhou no seriado “Criminal Minds” e no filme “Perdido em
Marte”, e ele montou uma equipe fenomenal para esse trabalho, incluindo o
produtor Adam Neal Gonzalez, que trabalhou com o Audiotopsy e está bastante
acostumado a trabalhar com clipes e filmagens de várias bandas renomadas. Não
temos planos para outro videoclipe no momento, mas se no futuro tivermos a
chance de nos reunirmos com o Dan novamente, com certeza vamos aproveitar a
oportunidade! Realmente o vídeo é um curta, deixamos o Daniel completamente
livre para criar, e ele expressou o que viu na letra da “Alive” – histórias de
superação e de luta pela vida, ilustradas pelos quatro membros da banda, cada
um representando um elemento da natureza, por isso o ele deu ao filme o título
de “Survival of the Four Elements – a Sobrevivência dos Quatro Elementos”.
Foram 3 dias de filmagem, extremamente intensos, cansativos, iniciávamos logo
cedo, às 6 ou 7 da manhã, mas só conseguíamos voltar ao hotel por volta de
meia-noite. E eu ainda tinha que tingir meu cabelo todos os dias, porque estava
com o cabelo tingido de roxo, a tinta desbotava um pouco depois da lavagem,
então foram 3 dias lavando e pintando o cabelo depois de uma maratona de
filmagens, foi algo meio insano (risos). Mas valeu a pena porque o resultado
ficou incrível.
EC - Novamente gostaria de agradecer por terem aceitado realizar a
entrevista para o Elegia e Canto. Vocês poderiam deixar uma mensagem para os
nossos leitores e fãs do Shadowside?
Dani: Eu que agradeço pelo espaço e por todo o
apoio! Espero que curtam o novo clipe “Alive” e o novo álbum “Shades of
Humanity”, e nos veremos em breve em algum show!
Confira o vídeo de Alive: